Através do Redy,cheguei ao post do Paulino sobre a necessidade de debatermos o empreendedorismo em CV.Ora bem,cá vai a minha reacção:
1- é preciso salientar a imprecisão do que o Paulino chamou “empreendedorismo por vocação”. A vocação é um termo demasiado vaga e cientificamente complexo para ser utilizada aqui: uma pessoa pode abrir uma pequena loja de costura porque o mundo da moda é a sua vocação e outra pessoa também pode abrir um empresa de programação e software porque esse é a sua vocação. Assim temos 2 empresas, que o Paulino poderia considerar com perspectivas futuras diferentes em termos do seu impacto económico, mas as duas foram abertas por vocação dos seus fundadores. O mais correcto e acertado, como faz a GEM nos seus estudos comparativos a nível mundial que faz anualmente, é a separação entre o “empreendedorismo por necessidade” e “empreendedorismo por oportunidade”. Está divisão é tão só apenas um indicador analítico e serve para caracterizar a taxa de empreendedorismo de um país conforme a motivação na criação de empresa. Aliás, vários autores dividem e classificam o empreendedorismo consoante o objectivo dos respectivos estudos e conforme a sua disciplina: por motivação (necessidade vs. oportunidade), pelo tipo da organização (empreendedorismo e criação de empresas, empreendedorismo social e intra-empreendedorismo) e ainda pelo tipo de empresa criada (empreendedorismo de base tecnológica/revolucionário, empreendedorismo de proximidade/rotineiro). É preciso também dizer, para terminarmos a parte sobre terminologias, que não podemos confundir o “empreendedorismo por necessidade” com o auto-emprego: um cria vários empregos (que pode até ser 2 empregos) e o outro, como o próprio nome diz, cria apenas 1 emprego;
2- Dizer que as politicas de incentivo ao empreendedorismo deve ser distinta conforme seja “empreendedorismo por vocação” (que vou passar a assumir como sendo empreendedorismo por oportunidade) ou "empreendedorismo por necessidade" parece-me um erro. É verdade que a maior parte das empresas que são criadas por necessidade não têm grande impacto na economia ou crescem pouco, mas isso não é devido a motivação inicial da criação da empresa em si e nem pelas características ou tipo de empresa criada. A ambição para fazer crescer a empresas depende da motivação e do papel do fundador/dirigente da empresa. Se aquela pessoa que abriu a pequena loja de costura tiver ambição para fazer crescer a sua loja, qualquer dia desses podemos vir a encontra-la com 5 lojas de costura, cada uma numa zona ou até lojas de roupa com marca própria em cada ilha. Com um bom serviço de consultadoria e apoio de gestão,é claro. Aliás temos um exemplo paradigmático disto: a rede dos supermercados “Calú & Ângela” começou por ser uma pequena loja de esquina, como muitos que existem por todo CV, até chegar ao que é hoje. E parece que tem planos de expandir para as outras ilhas. Portanto, dar mais “atenção” ao empreendedorismo por oportunidade em detrimento do empreendedorismo por necessidade é um erro; são precisamente estes últimos que merecem maior atenção por parte da ADEI no apoio na elaboração do plano de negócios e na implementação de práticas de gestão (geralmente, no empreendedorismo por oportunidade, que de facto tem maior impacto económico , os fundadores costumam ter mais experiência, maior e melhor acesso à redes sociais de relacionamento e maior capacidade de gestão e, por isso, na gestão corrente da empresa necessitam de menos apoio do que aqueles que abrem a empresa por necessidade). Por outro lado, muitas das empresas que nasceram por oportunidade acabam por não crescer muito por manifesta falta de ambição dos fundadores/gestores: nem sequer saem fora da Praia quanto mais pensar na sua internacionalização. Enfim, com um bom apoio por parte de ADEI,com incentivos por parte do Estado,qualquer pequeno empreendedor pode ter ambição de "ir mais longe" do que inicialmente sonhou. Entendo a intenção do Paulino quando defende uma politica de empreendedorismo diferenciada para fomentar o empreendedorismo por necessidade ou oportunidade;mas acho que aqui já estamos fora de "políticas de empreendedorismo" e dentro de "politicas de crescimento" ou, se quisermos, "politicas de apoio às PME" (que não é bem a mesma coisa que políticas de empreendedorismo);
3- falando sobre as políticas de empreendedorismo, temos de decidir se queremos limitar-nos a apoiar àqueles que abrem a sua empresa ou se queremos ambicionar criar uma cultura empreendedora em CV, se queremos ou não que os miúdos e jovens de hoje vejam no empreendedorismo um percurso profissional como um outro qualquer e optem por esse caminho quando iniciarem a sua vida profissional. A meu ver, por enquanto, temos vindo a apostar apenas no apoio aos empreendedores: na gestão da empresa, na formação em gestão, na elaboração do plano de negócios, nos incentivos fiscais, etc. Presume-se que há um empreendedor interior em todos nós e que basta uma isenção fiscal para que alguns decidam abrir a sua empresa; ou seja,estamos sentando a espera que os empreendedores “nasçam” por obra e milagre da natureza. Isto é o que chamo de “politicas passivas de empreendedorismo”. Elas são úteis e necessárias e ainda bem que tem sido uma aposta do actual governo. Mas isso é insuficiente para criarmos uma sociedade empreendedora. É a diferença entre apoiar e incentivar. Temos também de olhar para aquilo que podemos chamar de “politicas activas do empreendedorismo”, incentivar a criação de uma cultura empreendedora na sociedade e incutir nos miúdos e nos jovens o espírito empreendedor. De resto, os responsáveis políticos não precisam se preocupar “nadica de nada” com a tolerância ao risco ou qualquer outro atributo psicológico dos jovens para que estes sejam empreendedores. Nem precisamos de "formatar" a personalidade dos jovens. Precisamos é de ter incutir o espírito empreendedor nos jovens e isso consegue-se através da socialização. Espírito empreendedor nas pessoas e cultura empreendedora na sociedade!Daí a importância das políticas activas de empreendedorismo…
5 comentários:
Bem, acho que o tal empreendedor do tal debate nao vai gostar desta tua ideia de que uma loja de costura é empreendedorismo.
Como deves estar lembrado ele dizia que alguém que abre uma loja de sapatos nao é empreendedor.
E' o que eu digo, ha ca cada sabichao!
Mas agora em relaçao ao teu paper, nao me convences que empreendedor vai com socializaçao! Empreendedorismo a sério so pode marchar com liberalizaçao, com liberalismo!
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Alô meu caro,
Um belíssimo - e pertinente! - post, pá! Thanks pelos alertas sobre a terminologia, acabei por aprender muito, especialmente com o teu primeiro ponto.
Quanto ao segundo ponto, penso que aí temos visões ligeiramente diferentes em relação ao tema. Vou voltar ao assunto em breve para apresentar os meus argumentos, ok?
No que se refere ao terceiro ponto, aqui concordo 100% contigo. Mas também hei-de voltar ao assunto para trazer alguma achegas.
Valeu pelas achegas, meu caro. Este é um tema que precisa ser debatido - e já! - dada a necessidade de se desenhar e implementar políticas claras e consistentes, com visão de longo prazo. Se tiveres mais achegas, dicas ou fontes sobre isso, agradecia-te imenso que mas enviasse (paulinodias21@yahoo.com)
Um abraço,
Paulino Dias
Al Binda,
a socialização é o sentido cientifico utilizado em sociologia...os mais liberais dos liberais também são socializados...lembrei-me agora da história de vida do Amâncio Ortega,fundador do grupo Inditex (zara,pull and bear,massimo dutti,bershka,stradivarius,etc),homenmais rico da espanha.E começou a trabalhar aos 14 como empregado de loja e hoje tem o que tem...
Paulino,
continuaremos o debate quando voltares ao assunto..
Abraço aos dois..
Dizia num anterior post que se perdeu na estratosfera que nao percebia esse acordar tardio das pessoas para o empreendedorismo e cluster, conceitos que foram introduizdos na década de 90 pelo MPD e o seu assessor tuga Professor Ernani que morreu a semana passada!
O PAICV e seus gestores proximos andam a copiar tudo que disseram estava mal no MPD.
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