segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Privatização e Liberalização em Cabo Verde

Como a razão principal para a privatização das empresas estatais era obrigá-las a competir no mercado privado,aumentando,por conseguinte,a eficácia das mesmas,qualquer tentativa séria de incentivar a concorrência compreenderia a desintegração dos monopólios estatais antes que fossem vendidos e,contudo,isto não se fez (Electra e CV Telecom). Em vez de encorajar a concorrência,o governo optou por privatizar grandes monopólios na íntegra com intenção de criar novas agências reguladoras para controlar as políticas de determinação de preços de modo a garantir que não abusariam da sua posição.Uma empresa que tem a garantia da posição de monopólio do mercado vale,claramente,mais do que várias empresas separadas que,em certa medida,têm de competir mutuamente pelo negócio.Ou seja,privatizou-se empresas como a Electra e a CV Telecom mas,nos respectivos sectores,não houve liberalização.A ideia era de que a «privatização aumenta a eficácia produtiva quer com a existência do monopólio ou não» uma vez que a privatização,ao alterar a estrutura de incentivos para os gestores e,simultâneamente,libertar os gestores da pressão política,pode por si só melhorar a actuação da empresa.Em contrapartida,nos sectores onde houve a liberalização do mercado,com entrada de vários concorrentes,não há muitas razões de queixa: basta vermos o sector de importação de produtos alimentícios onde actuava a antiga EMPA.Fazendo o balanço,os argumentos e a evidência parecem indicar que é a concorrência,mais do que a propriedade,que tem maior impacto sobre a eficiência da empresa.Ou seja,a liberalização é muito mais significativa do que a privatização como factor provável de melhorar a eficiência da empresa.

sábado, 21 de agosto de 2010

Nacionalização ou Privatização (II)

Para além das razões económicas,também a ideologia e o dogma estão presentes nos programas de privatizações: o compromisso com os princípios de propriedade privada e da livre iniciativa.
É possível detectar 5 objectivos principais subjacentes ao programa de privatizações: 
  1º- é a preocupação de reduzir os empréstimos do sector público e aumentar as receitas do governo (a privatização proporciona duas alternativas para a redução de empréstimos do sector público- significava que os empréstimos das empresas privatizadas já não faziam parte das necessidades de empréstimos do sector público que os défices das empresas com perdas já não tinham de ser cobertas por empréstimos do governo;por outro lado,o governo obtém receitas da venda dos bens que contam no seu próprio sistema contabilístico como despesa negativa e,por conseguinte,ajuda a reduzir os empréstimos do sector público);
2º- melhor a eficácia e incentivar a concorrência (obrigar as empresas a competir no mercado privado,aumentando,por conseguinte,a eficácia das mesmas);
3º- reduzir o poder dos sindicatos (espera-se que a privatização vai impedir os gestores destas empresas de cederem à pressão exercida pelos sindicatos visto que já não podiam recorrer ao tesouro para liquidar a factura e o aparecimento da concorrência vai proporcionar fontes de abastecimento alternativas a que se pode recorrer em caso de greves);
4º- melhorar a autonomia e o incentivo da gestão enquanto se elimina a interferência política nos assuntos internos destas empresas (uma vez no sector privado,os ministros não teriam a possibilidade de pressionar as empresas a adoptarem políticas que não fossem do interesse comercial das mesmas e isto,por sua vez,reduziria a intensidade das exigências dos grupos de interesse aos políticos);
5º- criar o capitalismo popular (as privatizações também tem um objectivo sociológico:a criação do capitalismo popular no país;a ideia é que as pessoas só compreenderiam e apreciariam os benefícios do capitalismo se sentirem que fazem parte dele;a privatização poderia assim contribuiria para a mudança de valores e do comportamento das pessoas,permitindo-lhes a aquisição de pequenas participações nas empresas).

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Nacionalização ou Privatização (I)

Existem diversas razões para a nacionalização de empresas.Algumas vezes estavam a titubear à beira de um colapso, e a propriedade pública foi vista como a solução para os problemas de rentabilidade diminuta e falta de investimento há muito existentes. Por vezes, a decisão de nacionalização era impulsionada pela convicção de que uma estratégia de coordenação nacional seria mais eficaz do que um modelo de prestação de serviços não planeado. Outras vezes, a nacionalização ocorreu por razões de segurança nacional e, em alguns casos, foi vista como a única solução para os problemas do chamado «insucesso do mercado» nas indústrias que usufruíam daquilo que é conhecido por «monopólio natural». Muito frequentemente,todavia,a nacionalização é prosseguida como uma questão de princípio ideológico e político (o desejo de assegurar a propriedade e o controlo de,pelo menos,os sectores dominantes da economia).
Contudo,a eliminação da necessidade de obter lucros e da ameaça da possível falência no caso de insucesso resulta numa ausência de incentivos eficazes para aqueles que gerem as empresas nacionalizadas,e o princípio de controlo estatal significa,na prática,que os ministros são ambíguos a estabelecer e fazer cumprir objectivos.
Os defensores da nacionalização muitas vezes argumentam que estas empresas não devem ser avaliadas apenas pelos critérios da actuação financeira,visto que se espera que cumpram obrigações sociais não exigidas às empresas do sector privado. Contudo,são os consumidores os que mais sofrem em consequência da ineficácia das mesmas.É difícil fugir à ideia de que estas empresas não estejam a ser geridas nem «no interesse do público» nem para o benefício dos consumidores, mas sim no interesse dos que trabalham neles.

Risco e Medo de Falhar

A pouca propensão para o risco como argumento para o baixo índice de empreendedorismo entre os jovens é apenas um argumento desculpabilizante.A ideia é que "os jovens norte-americanos são mais empreendedores porque possuem maior propensão para o risco do que os jovens cabo-verdianos".Então,questiono eu,porque é que,imigrante nos Estados Unidos,os cabo-verdiano,jovens e menos jovens,tornam-se empreendedores e "assumem o risco"?Um jovem nos EUA decide abrir uma empresa no exacto momento que um jovem em CV mergulha no mar no meio de tubarões; qual deles é que assumiu maior risco?O que impede os jovens cabo-verdianos de empreender não é tanto o medo de perder o dinheiro investido na criação da empresa mas sim o medo de falhar.É o medo de ser rotulado de fracassado.O que diferencia os jovens norte-americanos dos cabo-verdianos não é a capacidade de assumir o risco,é o modo como lidamos com o fracasso.Enquanto para eles o fracasso ou a falência é apenas uma etapa para a aprendizagem,para nós o fracasso é quase uma "morte social".A sociedade norte-americana tolera e incentiva o fracasso;a nossa sociedade condena o fracasso.É por isso que eles não receiam tentar e falhar e nós,para não fracassarmos,nem sequer tentamos.

sábado, 14 de agosto de 2010

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

A exclusão social em Cabo Verde: uma abordagem preliminar (Carlos Sangreman Proença)

«Nesta década e meia, de 1989/90 a 2003/4, Cabo Verde foi claramente capaz de organizar as suas instituições estatais centrais e locais e estabelecer ligações com organizações da sociedade civil laicas ou religiosas para combater a pobreza. Em teoria não pensamos que haja a apontar criticas de maior à organização e às actividades desenvolvidas. Quanto muito a ambição de centralizar num PNLP os fundos para tal luta parece-nos menos correcta, face à capacidade das instituições do país e aos efeitos multiplicadores que esses processos têm quando a sua aplicação é descentralizada. Mas precisaríamos de muito mais tempo e informação para uma análise fiável dessa suspeita. Mas toda a questão e as análises tem de ser repensadas quando verificamos que a desigualdade cresceu significativamente. Ou seja, se em teoria as medidas tomadas estavam correctas então,um dos efeitos perversos tem sido de que o fosso entre os que acedem a mais recursos e os que acedem a menos, se aprofundou, cavando uma maior distância entre uns e outros. Aliás a diferença na qualidade de construção de habitação e arruamentos de algumas zonas na capital marca bem a estratificação social implícita nesse crescimento da desigualdade.Note-se que estamos a considerar que o modo de medir a pobreza pode incluir um erro que vai induzir em conclusões erradas. Ou seja, se a medida da pobreza é relativa, então pode toda a população estar melhor mas, pelo facto de se medir a pobreza sempre em relação a uma média que evolui no tempo, teremos mais pobres quando na realidade aquilo que temos é mais desigualdade. Dito de outro modo, as pessoas estão com condições de vida melhores que à dez anos, mas há é uma parte dessas pessoas que estão muito melhor. Logo a distancia entre uns e outros aumenta e no momento actual a diferença é maior do que era à dez anos. Se medirmos deste modo então a pobreza aumentou. Se medirmos em termos absolutos, ou seja, se as condições de acesso a alimentação, vestuário,habitação, educação, saúde e participação social, melhoraram ou não, então a pobreza diminuiu com as políticas públicas e privadas praticadas.»

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Empreendedorismo e Riscos

«José Maria Neves quer mais empreendedorismo em Cabo Verde. O Primeiro-Ministro considera que é necessário que os jovens tenham "mais ousadia" e apostem na criação de novas empresas, como solução para o desemprego e desenvolvimento do país. "Queremos que os jovens cabo-verdianos assumam mais os riscos da realização de investimentos.»


Tenho para mim que o ênfase no risco ou o apelo constante à assumpção do risco no incentivo ao empreendedorismo tem o efeito contrário ao pretendido: em vez de incentivar,desincentiva a atitude empreendedora.Empreender não tem nada a ver com propensão para o risco.Quem gosta de risco investe na bolsa de valores,aposta em cavalos ou anda de moto sem capacete.Para além do risco ser sempre um risco controlado através do plano de negócios,o risco não reside na fase da criação da empresa mas sim na sua sobrevivência e no seu crescimento.Mais do que assumir risco,ser empreendedor exige capacidade para reconhecer oportunidades mas também para definir um conceito de negócio,planear,implementar e avaliar a acção.Mais do que apelar aos jovens para que assumam o risco,ao governo cabe criar condições para minimizar os riscos da actividade empresarial,principalmente para as empresas recém-criadas ou start-up.O que tem feito o governo,ou a ADEI,para baixar ou suster o índice da mortalidade empresarial?

Nova gestão da rede fixa

Excelente noticia e excelente iniciativa esta do governo de Cabo Verde negociar com a CV Telecom uma nova gestão da rede fixa.É,aliás,a correcção de um erro da política de privatizações dos anos 90. E é simultâneamente uma tentativa correcção de uma falha do mercado.O facto da CV Telecom controlar tanto a produção como a distribuição dos serviços impede ou,no mínimo,dificulta a entrada de outros concorrentes no mercado: se a T+ resolver entrar no mercado do serviço de telefonia fixo teria que,para sermos prático,"sub-alugar" ou sub-contratar à CV Telecom a rede fixa.Acredito que esse é um dos principais motivos para não haver ainda um concorrente da CV Telecom no mercado cabo-verdiano.O paradoxal nisto é que quem está a corrigir um erro da política económica,promovendo o mercado e criando condições para surgir mais concorrência,é o partido que é acusado de ser pouco "amigo" do mercado.
Está situação,aliás,deveria servir como exemplo para a reestruturação ou uma futura privatização da Electra: a produção e a distribuição da electricidade e da água não devem ficar sob a alçada de uma mesma empresa.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

PILOTO DE TESTES

«O proselitismo liberal é a versão actual da vulgata marxista, que esteve muito em voga na passagem dos anos 60 para os 70. Como acontecia com quem então padecia da doença infantil do comunismo, também os nossos liberais tendem a moldar a realidade à sua construção teórica, ao mesmo tempo simples e com resposta para tudo. Ao fazerem-no esquecem, por um lado, a complexidade dos ajustamentos nas políticas públicas e, por outro, o país que realmente existe, feito de portugueses bem diferentes daqueles que conhecem ou projectam. O mantra "menos Estado" tornou-se, aliás, um novo "amanhã que canta", combinando as mesmas doses de optimismo e de normatividade com uma subjugação da realidade aos arquétipos de partida. Mas a realidade tem sempre razão.[...]» [i]
Pedro Adão e Silva.